No coração verde do Vale do Itajaí, entre os rios e as montanhas de Timbó e Rio dos Cedros, pulsa uma história de vida que é também a história de um povo. Aos 95 anos, Alvino Ittner carrega nas mãos calejadas e no olhar sereno a memória viva de um tempo em que tudo era feito com o suor do rosto, com a força da enxada e com a fé em dias melhores. Na data de 25 de julho, Dia do Colono, a redação do Jornal do Médio Vale quer celebrar sua trajetória – símbolo da luta, da simplicidade e da dignidade de quem ajudou a construir as bases das cidades que conhecemos hoje.
Nascido em meio ao mato virgem de Rio Bonito, interior do município de Rio dos Cedros, Alvino passou os primeiros anos de vida cercado por natureza bruta. Seu pai, Emílio, desmatou o suficiente para erguer uma casa simples, onde começou a história da família. Aos cinco anos, mudou-se para o bairro 15 de Setembro, onde viveu por décadas, até que o destino o trouxe para Timbó, no bairro das Capitais. Com sua esposa, Frida, o filho Kunibert e a filha Guisela, recomeçou mais uma vez, como era costume entre os colonos de seu tempo.
A vida de Alvino Ittner foi forjada no cabo da enxada. Entre plantações, criação de gado e o trabalho no açougue do Baia, em Rio dos Cedros, construiu seus dias. Mais tarde, em Timbó, dedicou 25 anos ao cuidado dos jardins da casa e da fazenda do senhor Tonoly. Sua alimentação vinha da roça: tudo era plantado e colhido com as próprias mãos. A rotina começava cedo, com o trato das vacas, o leite tirado na hora e o trabalho no campo até o fim da luz do dia.
As lembranças de infância são feitas de terra, de cheiros de comida no fogão a lenha e de brincadeiras simples: esconde-esconde no mato, rodas puxadas por cachorros, imitações de toras sendo levadas – tudo na imaginação viva das crianças. Não havia televisão, tampouco celular. Havia as domingueiras, as conversas ao redor do fogão, os homens jogando baralho, as mulheres trocando histórias e risadas. Era assim que se vivia.
A língua falada em casa era o dialeto alemão, o Platt, que se misturava com o português aos poucos, com o passar das gerações. Alvino se recorda com carinho de sua confirmação religiosa, quando ganhou sua primeira calça comprida, com suspensório. A religião protestante sempre foi o pilar da família, que ensinava o valor da honestidade, do trabalho e da fé.
Com emoção, relembra os tempos difíceis da criação dos filhos, quando o dinheiro era escasso e a criatividade era lei: fraldas feitas com sacos de trigo, roupas costuradas a partir de lençóis usados, bolsas escolares feitas com o que havia. Os tamancos de madeira protegiam do frio no inverno; no verão, os pés descalços encaravam o chão da roça e o caminho até a escola.
Hoje, observa com certo espanto e nostalgia as mudanças do tempo. “Agora as crianças não brincam mais, estão sempre com o celular na mão. As rodas de conversa desapareceram”, comenta com um sorriso triste, mas cheio de resignação. Ainda assim, se alegra em ter vivido numa época em que tudo era mais difícil, sim, mas talvez também mais humano.
Se pudesse deixar um conselho aos jovens de hoje, Alvino diria: “Trabalhem com dignidade, respeitem a família e não esqueçam de onde vieram.” O que mais o enche de orgulho? “Ter criado minha família com honestidade e ter mantido as tradições dos nossos pais.”
No Dia do Colono, celebramos muito mais do que a vida no campo. Celebramos histórias como a de Alvino Ittner, que ensina que a terra cultiva mais do que alimentos – cultiva memória, identidade e esperança. Que sua vida siga como raiz firme na história de todos nós.