A saúde mental no ambiente de trabalho se tornou uma preocupação crescente, impulsionada pelo aumento das pressões sobre os colaboradores e pelo impacto direto no rendimento das empresas. A partir de 26 de maio, segunda-feira, empresas brasileiras serão obrigadas a implementar planos de saúde mental e a avaliar riscos psicossociais no ambiente de trabalho. A exigência consta na atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), aprovada pelo Ministério do Trabalho e Emprego em agosto de 2024. A norma determina medidas preventivas, suporte aos funcionários e a avaliação de condições que podem causar estresse e transtornos psicológicos.
A psicóloga clínica e organizacional Francielle Hartmann (CRP SC 1209674) destaca a importância dessa mudança: “Entre os principais fatores que afetam a saúde mental dos trabalhadores estão metas excessivas, cobranças desproporcionais, jornadas prolongadas, falta de suporte, assédio moral, conflitos interpessoais e ausência de autonomia. Esses problemas têm se intensificado, gerando estresse crônico e afastamentos.”
Segundo a profissional, “a pressão constante por resultados, somada à falta de iniciativas voltadas para a saúde mental, cria um ambiente de trabalho insustentável. O estresse acumulado e a ausência de suporte emocional levam ao desenvolvimento de transtornos como ansiedade, depressão e burnout.”
Dados do Ministério da Previdência Social mostram a gravidade do cenário: foram registrados 470 mil afastamentos por saúde mental no Brasil em 2024, um recorde histórico. O número mais que dobrou em relação a 2014 (203 mil) e é quase 67% maior que em 2023. Para Francielle Hartmann, esse aumento resulta de uma combinação de fatores: “Pressão por produtividade, falta de políticas corporativas eficazes e dificuldades pessoais em lidar com as emoções formam um coquetel perigoso que leva ao adoecimento psicológico.”
Ela defende que a busca por terapia deve ser tratada como questão de saúde pública. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o Brasil lidera o ranking mundial de transtornos de ansiedade e está em quinto lugar em casos de depressão. “A terapia é fundamental não só para tratar os sintomas, mas também para promover resiliência emocional e autoconhecimento. Investir em suporte psicológico, tanto no governo quanto nas empresas, é essencial para reduzir afastamentos e construir uma sociedade mais equilibrada”, conclui Francielle.
Os impactos econômicos dessa crise são expressivos. Estudo da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg) aponta que afastamentos por transtornos mentais geram uma perda anual de R$ 397,2 bilhões no faturamento das empresas. Na economia nacional, a estimativa é de um impacto equivalente a 4,7% do Produto Interno Bruto (PIB).
Ainda sob os efeitos da pandemia de Covid-19, o problema se agravou, especialmente com a adoção do trabalho remoto, que dificultou a separação entre vida pessoal e profissional. “Muitos trabalhadores relatam exaustão, insônia e crises de ansiedade devido à sobrecarga e à falta de apoio emocional”, afirma a psicóloga.
Para reduzir os afastamentos por transtornos mentais, Francielle sugere que as empresas adotem as seguintes estratégias:
- Criar um ambiente de trabalho saudável, com valorização e equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
- Oferecer suporte psicológico, com atendimento interno ou parcerias.
- Flexibilizar a jornada, com horários ajustáveis e trabalho remoto.
- Capacitar lideranças para uma gestão humanizada e empática.
- Estimular a cultura do bem-estar, com pausas, atividades físicas e programas de qualidade de vida.
- Promover o autoconhecimento, com treinamentos sobre saúde emocional.
A profissional reforça que a saúde mental não deve ser encarada apenas como uma responsabilidade individual, mas como um desafio coletivo que exige ação coordenada entre trabalhadores, empresas e governo. “Cuidar da mente é tão essencial quanto cuidar do corpo. Quando compreendemos isso, damos o primeiro passo para uma vida mais equilibrada e produtiva”, destaca.
Ela também aponta que abordagens terapêuticas, como a terapia cognitivo-comportamental (TCC) e princípios do estoicismo, podem ser grandes aliadas nesse processo: “A TCC auxilia na identificação de pensamentos disfuncionais, enquanto o estoicismo ensina a focar no que está sob nosso controle. Juntas, essas abordagens fortalecem a resiliência emocional”, explica Francielle.
Enquanto os trabalhadores buscam alternativas para preservar sua saúde mental, as empresas também precisam assumir sua parte de responsabilidade. “Implementar programas de apoio psicológico, flexibilizar horários e criar uma cultura organizacional mais humanizada são medidas fundamentais”, defende Francielle Hartmann.